O Pistache e o Inseto

 Eles entraram no restaurante com propósito, determinação, e para ser bem sincero, com uma coordenação digna de riso. Ela era magra, muito magra, ele era gordo, muito gordo. Enquanto liam a carta de vinhos ele não parava de tocá-la. Um apertãozinho carinhoso na mão, uma leve massagem nas costas, uma ocasional carícia na orelha, como uma faxineira removendo o pó de um vaso.  Peculiar ao extremo e excepcionalmente cavalheiresco.

Ela usava óculos extraordinários, preto e laranja, que lhe concedia a aparência bizarra de um inseto exótico, acentuado pela maneira árdega em que sugava seu Gim e Tônica pelo canudinho.

Ele era provavelmente um banqueiro, e pelo que tudo indicava daqueles bem ricos com uma propensão para comidas gordurosas, muito bem vestido e desconfortavelmente encapsulado em seu terno, como se fosse um pistache rompendo de sua casca. Mas, o que mais impressionava era a composição entre os dois.

Eu me dirigi à minha filha que passava os olhos pelo cardápio e disse: “dê uma olhadinha para trás. Um casal na outra mesa usando ternos combinados de risca de giz. Por que é que duas pessoas iriam combinar roupas assim?” Ela esperou um momento e disse: “Alguns casais gostam de combinar roupas adequadamente”, olhando para a minha como que me lembrando que eu e ela não formávamos aquele tipo de casal.

Bem, eu não sou do tipo que faz psicanálise de todas as situações, mas, sério, por que é que um casal usaria ternos risca de giz combinando? Combinando ao extremo em que as listas eram da mesma espessura, padrão e frequência de repetição, costuradas provavelmente pelo mesmo alfaiate, ela numa blusa preta, ele numa camisa preta. Eu fiquei imaginando os dois em casa conversando:

Querida, o que vamos vestir hoje à noite?

Que tal irmos com nossos jeans Levis e camisas brancas?

Não, o local tem um estilo assim mais italiano, que tal usarmos nossas Polos verdes idênticas?

Ah, as duas estão lavando, nós usamos na terça, lembra?

Vamos então com nossos ternos risca de giz!

Ótima ideia! Eles combinam tão perfeitamente, não é mesmo? Eu AMO aquele alfaiate.

Voltei atenção novamente à minha filha e disse? “Ninguém deveria vestir assim tão combinadinho. É hilário. Se importa se eu fizer algumas anotações? Preciso escrever sobre isso.”

“Bem, fique à vontade”, respondeu ela atirando o guardanapo em cima da mesa, revirando os olhos, e concluindo: “Eu vou ao banheiro enquanto isso”…

Humm… Será que a minha filha me acha esquisito?

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2 comentários sobre “O Pistache e o Inseto

  1. Eu achei o casal interessante. E se eles trabalham no mesmo lugar? E se forem de uma banda? E se forem irmão gêmeos acostumados a usar a mesma roupa desde crianças?

    Você é futriqueiro. 😉

    beijo

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